segunda-feira, 1 de março de 2010

UMA "COMISSÃO DA VERDADE" PARA CELSO DANIEL?

Há oito anos, no dia 20 de janeiro, Celso Daniel foi encontrado morto, assassinado com diversos tiros depois de ter sido sequestrado e torturado. Decorrido tanto tempo, até hoje não foram julgados nem os executores e nem mandantes deste crime. Também não foram devidamente esclarecidas outras inúmeras mortes relacionadas a ele.

Hoje, no aniversário de sua morte, num contexto em que muito se discute em nosso país o Programa de Direitos Humanos, mais uma vez vimos a público dizer que o desvendamento do assassinato de Celso é também uma questão de direitos humanos.

Acreditamos que um país que através de seu governo e de suas instituições não se mostra capaz de impedir mortes como a de Celso, de Toninho do PT e de tantos outros, e incapaz de desvendá-las, de julgar e punir seus verdadeiros assassinos, tem um longo caminho a percorrer antes de se arvorar um país dos direitos humanos.

Esta situação se mostra ainda mais grave quando consideramos que, como consequência do assassinato de Celso e de nossa luta por seu esclarecimento, nos encontramos exilados com refúgio estatutário outorgado pelo Estado francês, privados de gozar de segurança em nosso próprio país, eliminando nossos projetos políticos e pessoais, nossas relações afetivas, nossos pertencimentos cotidianos, nossas práticas culturais, levando a uma fratura incurável entre nossa vida, nossos trabalhos e nosso lar.

Não há como mais uma vez não perguntar: por que tanta demora? O que se esconde por trás dela?

É necessário responder também a outras questões a elas relacionadas:

- Por que a autoridade policial (o DHPP), responsável pelo inquérito desse assassinato cometeu tantos erros, apontados por nós e pelo Ministério Público?

- Por que tantos outros assassinatos que aconteceram depois daquele do Celso já foram levados a júri popular, inclusive com condenações dos culpados?

- Quais expedientes são utilizados pela defesa dos assassinos para prolongar nossa agonia? Como evitá-los sem cercear a possibilidade da defesa?

- Por que reformas institucionais como as ligadas ao Poder Judiciário, ao sistema penitenciário (onde uma das peças-chave do crime foi assassinada na presença de sua advogada), ao aparato policial, que de modo geral não goza de independência para apurar crimes ligados aos poderes políticos e econômicos não acontecem em nosso país?

- Por que o Congresso e os partidos não enfrentam a questão do financiamento de campanhas eleitorais, fonte de tantas ilegalidades nas relações entre setores público e privado?

- Por que até hoje não há legislação que coloque todos os cidadãos em condição de igualdade, sem os foros privilegiados que contribuem para a impunidade em nosso país, por exemplo, de parlamentares? Por que governos e partidos ditos democráticos não colocam em suas agendas esse debate?

- Por que Sérgio Gomes da Silva, depois de preso, recebeu habeas corpus do Supremo Tribunal Federal, sob a alegação de não representar perigo para a sociedade, depois de ser indiciado pelo Ministério Publico como mandante do assassinato de Celso?

Diante disso tudo, mais uma vez vimos a público demandar a instalação de júri popular para o julgamento do mandante já indiciado, o empresário Sergio Gomes da Silva, e dos executores do assassinato do Celso, como uma questão de direitos humanos e que afeta diretamente o aprofundamento da democracia em nosso país.

França, 20 de janeiro de 2010

Bruno José Daniel Filho, irmão de Celso Daniel, exilado na França

Marilena Nakano, cunhada de Celso Daniel, exilada na França

Publicação: O Estado de S. Paulo, 20.1.2010

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