terça-feira, 6 de abril de 2010

HÁ ALGUMA COISA NOVA DEBAIXO DO SOL

O presidente da República é homem de sete instrumentos, ou de 70, quem sabe. Ele canta, assobia, dança, toca piano, sopra flauta, maneja o violino, discursa sobre qualquer tema, tudo ao mesmo tempo! Não é qualquer artista que pode ostentar tamanhas habilidades. Por possuí-las, tuteia Sarkozy e Obama, e se não dançou uma quadrilha em Buckingham ou no reino da Suécia não foi por acanhamento ou imperícia. Graças a tamanhos atributos, chamou a atenção de gregos e troianos, tanto mais quando não frequentou escola de belas-artes nem jardins peripatéticos. Pois bem, se não mentem as pesquisas de opinião, sua popularidade atinge os píncaros da incredibilidade. No entanto, ao aproximar-se do termo de seu segundo mandato, o indivíduo que superara montanhas e despenhadeiros, em meio à cerração, entrou a revelar sinais de outra personalidade. Primeiro foi em Havana, emudecido, depois falante, a dizer o que nunca falara, acerca das excelências da “Justiça cubana”, ao mesmo tempo em que se referia com desdém aos que, por desespero, recorrem à greve de fome. Embora fossem antigas as simpatias pelo comandante vitalício, hoje convertido no mais idoso ditador do mundo ocidental, prestou tributo ao regime de Fidel. Foi além. À maneira do coronel Chávez, para fazer praça contra os Estados Unidos, virou confrade do dirigente do Irã, em cujos domínios não prima o respeito aos direitos humanos, e vem despertando preocupações internacionais dada sua antiga e constante busca do domínio do complexo nuclear. Outros ditadores afrontaram a Sociedade das Nações e arrostaram a comunidade internacional, afirmando que tratados não passavam de farrapos de papel e a humanidade purgou as desgraças da maior guerra mundial.

Tudo isso, reduzido a sua expressão mais simples, já era muito. Mas outro dado foi forjado pelo honrado presidente da República. O litígio gratuitamente por ele aberto contra o jornalismo é da maior gravidade, não se pejou de atribuir “má-fé” a profissionais da área, que, por exemplo, não aplaudem o “mensalão”, essa conduta não indica bom sinal, pois não me recordo de presidente que tenha desfrutado de publicidade semelhante como ele e por parte de todos os meios de comunicação. Aliás, recordo-me de que ele próprio reconheceu que, sem a imprensa livre, não teria chegado à presidência. De resto, desde os tempos de sindicalista, antes, portanto, de tornar-se dirigente político e fundador de partido, ele foi generosamente aquinhoado pelas luzes da mídia. Por uma estranha coincidência, essa perigosa postura sucede no exato momento em que o seu hermano coronel Chávez comete os maiores desatinos contra os meios de comunicação em seu país, que, por sinal, começa a colher os frutos de uma política desvairada. E, porque figura de relevo naquele país no mundo da publicidade, relatou, como jornalista, a violência que lá vem sendo praticada, à Sociedade Interamericana de Imprensa, foi preso e contra ele aberto processo criminal por ordem do caudilho da Venezuela, exatamente o mesmo que o presidente brasileiro tem insistido obsessivamente por seu ingresso no Mercosul. Meras coincidências?

Isto sem esquecer que o seu PNDH, Plano Nacional de Direitos Humanos, é nítida contrafação bolivariana à Constituição brasileira.

Os fatos são notórios, a mostrar que, contrariando Salomão, há alguma coisa nova debaixo do sol.

Paulo Brossard
Jurista, Ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal
Publicado na edição de 05/04/2010 do jornal Zero Hora

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